Crianças

Dia destes, meu filho Benício, de apenas 4 anos, armou a maior bagunça num supermercado da cidade: correndo por entre as gôndolas, na ânsia de se esconder, acabou derrubando produtos de algumas prateleiras. Sob o olhar inquisidor de outros adultos, fiquei impelido a agir.

Minha esposa e eu inúmeras vezes nos perguntamos se estamos acertando ao cuidar de nosso filho. Se não estamos impondo-lhe um excessivo balizamento que, em nome de um determinado código social, poderá atrofiar suas habilidades e potencialidades.

Nós, adultos que pretendemos o topo da hierarquia geracional, ditamos as regras e as condutas sob as quais as crianças devem viver. Arrogando alguma sabedoria, talvez até sofista, impomos aos pequeninos um modelo que deve ser seguido, de tal modo que as transgressões naturais para suas tenras idades são imediatamente punidas com privações e castigos. Todas as vezes que vejo estes estratagemas sendo utilizados, imediatamente me indago: será que esta é a postura correta de quem deseja preservar e garantir o pleno desenvolvimento de uma criança?

Não tenho resposta, mas tenho algumas pistas interessantes que sinalizam para algum caminho. Duas pistas da literatura, uma da ciência e a última do maior sábio já conhecido.

Primeiramente Peter Pan. Seu criador, o inglês James Matthew Barrie, nos apresenta um menino que não queria tornar-se adulto. Já para o poeta e escritor norte americano Francisc Scott Fitzgerald, seu notável Benjamin Button, nascera idoso e com o passar do tempo tornara-se criança, até que em seu derradeiro dia ele exalava o frescor de um recém-nascido, numa clara alusão de que, se com o passar do tempo tendemos para a evolução, para Fitzgerald, a versão mais evoluída de nos mesmos está em nossa fase pueril. Já os neurocientistas afirmam que nascemos com cerca de cem bilhões de neurônios, para na idade adulta ostentarmos apenas vinte bilhões. Perdemos oitenta por cento de nossa capacidade neurológica na transição da infância para a idade adulta.

Por fim a tradição cristã eternizou, no evangelho de Mateus, um momento da vida de Jesus no qual ele interpela seus colegas dizendo: “deixem vir as crianças. Não as impeçam, pois, o Reino dos Céus pertence aos que são semelhantes a elas”.

Olhando para estes referenciais, a dúvida aumenta ainda mais. Será que nossas medidas impostas aos pequeninos, na pretensão de bem educá-los, não estariam arrefecendo suas capacidades e potencialidades?

Na dúvida, naquele dia no supermercado, preferi a via do diálogo. Me abaixei diante do meu filho e, depois de um abraço, conversei com ele. Depois de me ouvir, estando ele ainda arredio, fomos juntos recolher os produtos caídos das prateleiras.

Ronei Costa

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