Um dos maiores, senão o maior responsável pelo que hoje conhecemos da religião cristã chama-se Paulo de Tarso, o apóstolo Paulo, um cidadão cosmopolita, influenciado pelas culturas hebraica, romana e grega. Enquanto os Evangelhos foram escritos por entre os anos 70 e 100 da nossa era, as cartas de Paulo, que significam quase um terço no Novo Testamento, são escritas 20 anos antes. O primeiro registro da ressurreição foi feito por Paulo em I-Cor 15,3-8, por volta do ano 50, além de ter sido ele o primeiro a chamar Jesus de Cristo. Além disso lembremos entre os anos 66 e 73 aconteceu a guerra judaico-romana, que destruiu Jerusalém e com ela boa parte das memórias da vida de Jesus, exceto a ‘fonte Q’ e os escritos de Paulo que, como sabemos, eram destinados a animar comunidades muito distantes de Jerusalém, razão pela qual tais registros resistiram á guerra. Por estas razões é muito provável que a escrita dos próprios Evangelhos tenha sido, em alguma medida, inspirada nas cartas de Paulo.
Lembremos ainda que na fase do cristianismo nascente, a chamada era dos mártires, havia dois grupos de nazarenos: os hebreus e os helênicos. O primeiro, liderado do Pedro e Thiago defendia que Jesus viera para reformar o judaísmo e que para seguir a Jesus Cristo, antes era preciso ser judeu; o segundo grupo liderado por Paulo e Estevam defendia que a mensagem de Jesus deveria ser universal e irrestrita. Se a retórica de Paulo tivesse sido ignorada é provável que o cristianismo tal como o conhecemos não existisse.
Após este ligeiro prólogo e a propósito da Páscoa, pensemos, então, na ressurreição de Cristo, sob a ótica paulina. Se fosse possível perguntar a Paulo quem é Jesus Cristo, certamente responderia: Cristo é a comunidade reunida. Esta capacidade abstrativa é o principal eixo da Teologia Paulina e se ancora na ideia do Corpo Místico de Cristo, ou seja, a comunidade. Sua tese é cristalina: para ele não somos pessoas isoladas, mas sim membros enxertados num único corpo.
O salto hermenêutico se dá do entendimento de um corpo físico e biológico, para a compreensão de um corpo místico, do qual todos nós, independentemente das fronteiras geográficas ou existenciais, somos membros indispensáveis. Para ele não é possível se desenvolver isoladamente. Separados não há vida, apenas morte! Assim, o encontro com o ressuscitado se dará quando percebermos que somos membros deste único e indivisível Corpo, de tal modo que a alegria do outro será a minha alegria e a dor do outro, a minha dor.
A teologia Paulina é, portanto, um tratado de combate ao individualismo e ao egoísmo, que uma vez superados permitirá o vislumbre do corpo glorioso do ressuscitado, do qual todos e cada um somos parte.
Boa Páscoa a todos!